Cutucava ele as próprias antenas, disparate à suposição do real, quando descobriu por intermédio alheio que sofria de um diferente mal. Mal expressado o verso, talvez o bem, quem o saberia? O fato é que: fato consolidado, todos sabiam, ele nunca saberia. Que tinha memória de barata nata - ata da ciência que ao caso justificou. O que em nós é lembrança certa, nele já acendeu e já apagou. Resultado: nunca teve tal família. Não por abandono - como a alguns cabe a via. Nem por discriminação - essa ação tola de dar dó. Nem por opção de escolha - ninguém escolhe ser só. Nem por acordo, nem por dinheiro, nem por decreto de falsa democracia. Ele não tinha pai, mãe, irmão, tia, simplesmente, porque passavam dez minutos e não mais os reconhecia. E tinha de ser lembrado toda noite, todo dia, toda noite, todo dia, que aquela que acolhe o suspiro do choro também divide o grito de alegria. Ela, sim, sem opção de escolha, porque uma mãe não escolhe um filho, como um filho escolhe uma amiga. Isso talvez doesse nela (na família), mas o homem da memória de barata... ele nunca saberia. Nem do quente, muito menos do frio. Nem da melhor parte da língua - a que distingue o gosto. Ele não gravava braço ou perna. Ele não gravava rosto. Até o espelho mais memória que ele tinha, pois, a imagem que ele via cedo, ao espelho não tardaria afujentar-se dos traços. Não por medo, mas por tédio dessa vaidade vazia que o ser humano carrega no seu inconsciente de mierda. Ele não lembrava da própria imagem, mas a imagem - falsa - dele lembraria. Porém, memória de barata, ele nunca soube, saberá ou saberia. Da falta de um abraço, não do chocho, daquele que dá laço. Da falta do beijo que faz dar vontade de rir. Do tesão incontrolável. Do gozo intenso. Do costume do cheiro. Da necessidade da presença. Da sentença mais bonita do eu amo você. Para ele tão pouco duraria e seria tão ligeiro, que a intensidade do desejo na água se diluiria. E pelo menos uma pessoa no mundo ainda por ele se magoaria. Não por maldade, por sua vez, definia sentimentos como a possibilidade de um cego enxergar: não os tinha. Não sentia beliscão e nem algo que ao corpo desvia. Não sentia nada. E nunca saberia. Do amor - que é o que a gente, nós todos, não entende, não por capricho, nem por carência dita, mas, talvez, por uma flexão errada do espaçotempo que gera a mais aflita agonia. O que a gente não entende por mistério, ele não entende por sacanagem da memória ativa. Para nós, o caminho quase sempre é o de volta. Para ele, é sempre o de ida. Em comum, só a certeza lida e relida de que, sobre o amor, ele nunca, e a gente também nunca.
sábado, 16 de maio de 2009
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